Governo debate sobre corte de gastos e entra na 3ª semana sem anúncio
O esperado pacote fiscal, com medidas de corte de gastos por parte do governo federal, continua sem data para ser anunciado. Até a manhã desta segunda-feira (11), não havia perspectiva de quando a equipe econômica faria o anúncio oficial dos principais pontos, em meio ao impasse envolvendo, principalmente, ministros de pastas ligadas à área social que resistem a reduzir seus orçamentos.
Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve reuniões praticamente diárias para tratar do assunto – e ainda não se convenceu sobre o que deve ser anunciado, embora tenha compreendido a necessidade de o governo reduzir despesas.
Na última semana, inclusive, Lula pediu ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), que adiasse uma viagem oficial à Europa para permanecer em Brasília (DF) e participar das reuniões sobre o pacote fiscal com outros ministérios. Foi o que ocorreu. Mesmo assim, ainda não há consenso dentro do governo sobre as medidas.
Haddad, que deixaria Brasília rumo a São Paulo (SP) na última sexta-feira (8), acabou ficando na capital federal para participar de uma nova rodada de discussões com Lula e os demais ministros. Aquela que poderia ser a última reunião sobre o corte de gastos, no entanto, também terminou sem definição e muito menos qualquer anúncio. Haddad seguiu para São Paulo apenas na sexta à noite, mas já está de volta a Brasília.
Inicialmente, em entrevista a jornalistas na última semana, o ministro da Fazenda havia indicado que as medidas estavam próximas de ser fechadas por Lula e que o anúncio poderia ocorrer ainda naquela semana. A expectativa do mercado cresceu e, diante da indefinição do governo nos dias subsequentes, houve tensão entre os investidores e o dólar escalou.
Lula e Haddad reconhecem que, antes de o governo anunciar o pacote fiscal, é necessário apresentar as medidas aos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Na semana passada, ambos participaram da 10ª Cúpula de Presidentes dos Parlamentos do G20 (P20), encerrada nesta sexta-feira (8), o que impossibilitou qualquer tratativa sobre o corte de gastos com integrantes do governo. Além disso, Pacheco teve de viajar para Belo Horizonte (MG), na própria sexta, em função da morte de seu pai.
Ministros que comandam pastas ligadas à área social, como Wellington Dias (Assistência Social), Carlos Lupi (Previdência) e Luiz Marinho (Trabalho) estão entre aqueles que resistem fortemente ao ajuste fiscal.
Desde o fim de outubro, Marinho subiu o tom, publicamente, contra a equipe econômica e disse que não havia sido informado sobre qualquer mudança no seguro-desemprego, no abono salarial e na multa de 40% por demissão sem justa causa dos trabalhadores.
“Se ninguém conversou comigo, não existe [debate sobre essas supostas mudanças]. Eu sou responsável pelo Trabalho e Emprego. A não ser que o governo me demita”, disparou Marinho.
Lupi, por sua vez, também ameaçou deixar o governo caso as medidas de corte de gastos afetem benefícios previdenciários que, em sua visão, seriam “direitos adquiridos” – ou alteram a política de aumento do salário mínimo.
“Nosso grande desafio é o equilíbrio fiscal. Como fazê-lo em cima da miséria do povo brasileiro? Quero discutir taxação das grandes fortunas. O Haddad até está propondo isso. Quem tem que doar algo nesse processo é quem tem muito, não quem não tem nada. Como vai pegar a Previdência?”, questiona Lupi.
“A média salarial das pessoas é R$ 1.860. Vou fazer o quê com isso? Tirar direito adquirido? Não conte comigo. Vou baixar o salário? Não conte comigo. Vou deixar de ter ganho real [no salário mínimo]? Não conte comigo. Se isso acontecer, não tenho como ficar no governo. Acho que o governo não fará isso. Temos que cobrar os grandes devedores, a sonegação e as isenções indevidas”, afirmou o ministro.
Segundo Carlos Lupi, “despesa obrigatória não tem como ser cortada”. “Acha que algum congressista vai tirar direito de aposentado? Tenho que nascer de novo para acreditar nessa história. O que podemos fazer, e estamos fazendo, é apertar as irregularidades. Estamos fazendo uma economia grande conferindo gente que não tem mais direito à licença por doença. Se um cara teve uma doença e se curou, como continua tendo licença?”, explicou.
“O grande desafio da Previdência é que mais da metade dos nossos pedidos são de auxílio-doença. O Brasil está doente assim? Temos que melhorar, por exemplo, a biometria. Precisamos botar tecnologia de ponta e ajudar quem tem direito, separar o joio do trigo.”
Uma das alternativas em análise pela equipe econômica é fazer um “redesenho” do abono salarial (uma espécie de 13º salário pago a trabalhadores com carteira que recebem até dois salários mínimos).
Integrantes do governo avaliam que o benefício – que custará R$ 30,7 bilhões em 2025 – pode ficar mais concentrado nos mais pobres. De acordo com as regras vigentes, uma quantidade cada vez maior de pessoas tem se beneficiado do abono, que é impulsionado pela própria política de valorização do salário mínimo.
Por outro lado, a desvinculação de benefícios sociais, como o abono e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), em relação ao salário mínimo, está descartada pelo governo.
Ainda há quem defenda, na equipe econômica, que os pisos de saúde e educação sejam alterados, mas a medida não conta com a simpatia de Lula e de ministros da área social do governo. Até o momento, as simulações apresentadas ao presidente da República indicam que haveria um
Um dos pilares das medidas apresentadas pelo Ministério da Fazenda a Lula seria a adoção de instrumentos que ajudassem a otimizar a revisão de políticas sociais, minimizando possíveis irregularidades. Uma das ideias levantadas é a exigência de biometria.
Um outro passo importante seria a ampliação do público-alvo da revisão, até então restrita às pessoas que estão com o cadastro desatualizado há mais de 48 meses. Com a ampliação, esse tempo seria reduzido para 24 meses.
Também têm participado das reuniões sobre o pacote fiscal os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa (Casa Civil), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), Camilo Santana (Educação), Nísia Trindade (Saúde) e Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social da Presidência).